Boletim de letras, ideias, diálogos e crítica
Casa México- Aljuriça (Portugal)
Casa de Mexico, casa de la cultura, donde los libros son la verdadera Universidad.
(O primeiro Boletim electrónico publicado na Freguesia de Cadima para o Mundo)
…Para las niñas y niños de Portugal, México, Costa Rica, Hispanoamérica e America Portugueza es esta publicación mensual…
* Porque o mundo me empurrou/ Caí na lama, e então/ Tomei-lhe a cor, mas não sou/ A lama que muitos são. ( António Aleixo)
“ Há tantos burros mandando/ Em homens de inteligência/ Que as vezes fico pensando/ Que a burrice e uma ciência “ ( Antonio Aleixo )
“ Ao refugiar-me nos livros aprendi a fugir do mal sem o experimentar”
Camilo C. Branco
*“Procurando o bem para os nossos semelhantes encontramos o nosso”
Platão
"A leitura para mim sempre foi uma fonte de prazer, e gostaria que isso fosse uma coisa generalizada." "Um país se faz com homens e com livros"
Monteiro Lobato
PUBLICAÇÃO MENSAL, em PORTUGUÊS e CASTELHANO, QUE TEM COMO OBJECTIVO A PUBLICAÇÃO DE TRADUÇÕES DE TEXTOS DE AUTORES PORTUGUESES, CASTELHANOS E LATINO-AMERICANOS, RESENHAS DE PUBLICAÇÕES RECENTES E PASSADAS E NOTÍCIAS SOBRE EVENTOS CULTURAIS D’AQUÉM E D’ALÉM MAR. (GANDRASMEXICOCOSTARICA.BLOGS.SAPO.PT)
Presentación
Boletín de periocidad mensual aparece en septiembre de 2009 como fruto del amor por las letras luso-mexicanas. El objectivo esencial de Casa México es coadyuvar en la promoción y en la difusión de las literaturas clásica y contemporânea. Dicha publicación llega a los cuatro rincones del mundo por Internet.
O EXÉRCITO PORTUGUÊS
E O INÍCIO DA GUERRA PENINSULAR
A história da Guerra Peninsular tem seguido sempre um processo narrativo que, começando com a Revolta do Dois de Maio em Madrid, descreve sucessivamente a revolta das Astúrias, da Galiza, da Catalunha e o cerco de Saragoça, passa depois para a descrição da vitória francesa de Medina del Rioseco, a entrada de José Bonaparte em Madrid, passando posteriormente para as operações do marechal Moncey em Valência e de Dupont na Andaluzia. A narrativa pode começar, ou não, com a Primeira Invasão de Portugal, mas aborda sempre, naturalmente, a desagregação da Casa Real espanhola e as consequências que essa luta intestina trouxe para a prossecução da política de Napoleão Bonaparte para a península Ibérica. Depois de relatar os acontecimentos em Espanha a narrativa passa normalmente para Portugal, onde a sublevação portuguesa é muito rapidamente descrita, abordando-se essencialmente o desembarque britânico na foz do rio Mondego, e as duas confrontações entre os exércitos britânico e francês na Roliça e no Vimeiro e a sua consequência: a Convenção entre o Exército Francês e o Exército Britânico.
Esta organização da narrativa nada tem de errado, evidentemente, mas ao isolar os acontecimentos portugueses dos espanhóis tem obviado a que se perceba a interacção que os factos, de um e do outro lado da fronteira, tiveram entre si, e que permitiram o rápido esboroar da primeira campanha francesa na península.
Esta é tão-somente uma primeira tentativa de ver a revolta dos dois países ibéricos num contexto global, apostando numa perspectiva sincrónica. Penso que fica mais claro, assim, o que aconteceu em Portugal, e sobretudo penso que fica bastante mais claro o contributo do Exército Português na revolta, sendo que, por motivos mais ideológicos do que historiográficos, se tem dado muita importância à participação da igreja portuguesa na revolta, confundindo-se datas e objectivos, 1809 com 1808, a sublevação com a recomposição do Estado, e à falta de uma direcção política da classe média lusa – a que se dava “antigamente” o nome de burguesia1.
A Sublevação Nacional no Norte e Centro de Portugal
Na segunda-feira dia 6 de Junho de 18082, no Porto, o general espanhol Domingos Ballesta, comandante das forças de ocupação espanholas da província de Entre-Douro-e-Minho desde a morte do general Taranco que as tinha dirigido na invasão de Portugal em Dezembro de 1807, prendeu o general francês Quesnel, enviado por Junot para governar as províncias do norte3.
O general espanhol cumpria ordens da Junta Governativa da Galiza, criada após a revolta de 30 de Maio na Corunha e no Ferrol, uma das muitas Juntas de Governo, formadas um pouco por toda a Espanha após o levantamento madrileno do Dois de Maio, e regressava para preparar a luta contra o Exército Francês de ocupação de Espanha.
O general Ballesta reuniu à sua volta as antigas autoridades da cidade, assim como o governador interino das Armas do Partido do Porto, o brigadeiro Luís de Oliveira da Costa. Informou-os da retirada das forças espanholas e aconselhou-os a restabelecer o governo legítimo.
A proposta era mais fácil de expressar do que realizar.
O general de Divisão Loison, comandante da 2.ª Divisão do Exército de Junot, o governador de Portugal em nome de Napoleão Bonaparte, acabava de chegar a Almeida com quatro mil homens, estacionando entre Almeida e Cidade Rodrigo, tentando manter as comunicações entre o “Exército de Portugal” – o antigo 1.º Corpo de Observação da Gironda – e o Corpo de Observação dos Pirenéus, comandado pelo marechal Bessières, agrupado à volta de Burgos. Por isso, o governador interino decidiu manter o status quo. Mas não ficou inactivo. Chamou de Viana do Castelo um destacamento do Regimento de Artilharia n.º 4, comando pelo capitão Mariz e começou a reorganizar os Regimentos de Milícias do Porto, da Maia, de Penafiel e de Aveiro4. As Milícias tinham sido licenciadas pelo general Taranco, enquanto governador da província, em nome da rainha da Etrúria, ordem que tinha sido realizada de acordo com o general Junot, e confirmada por ele após 1 de Fevereiro de 1808, quando assumiu o governo de Portugal. Era portanto uma medida ilegal, face ao decidido pelo governo francês.
O brigadeiro Oliveira e Costa estava a tomar decisões que preparavam o Porto para a defesa, mas a prisão do major Raimundo Pinheiro, governador do Castelo da Foz, por ter arvorado a bandeira portuguesa e entrado em contacto com um navio de guerra britânico, faziam desconfiar da sua lealdade, que parece ser tão-somente ponderação face ao inimigo.
Entretanto, devido à divulgação da saída das tropas espanholas do Porto e do suposto restabelecimento do governo em nome do príncipe regente, outras povoações do Norte de Portugal declararam a restauração do governo nas suas respectivas localidades. Em Chaves, Miranda, Moncorvo, em Melgaço, no dia 9, Monção, Braga e um pouco por toda a parte. Os militares tomaram sempre a direcção política dos levantamentos populares, e decidiram desde o primeiro momento a organização dos regimentos de linha, de infantaria e cavalaria, do Exército, e dos regimentos de Milícias, assim como a rápida subordinação a uma Junta de Governo.
Quando, no dia 18 de Junho se soube que iam chegar tropas francesas ao Porto, a população e os soldados do destacamento de artilharia revoltaram-se contra as medidas tomadas pelo governador das Armas. Durante todo o dia e toda a noite a excitação foi grande. O governador interino foi “destituído” e a função entregue ao coronel José Cardoso de Meneses, comandante do Regimento de Infantaria n.º 6, mas que, acusado de tentar entrar em contacto com Junot, foi por sua vez “destituído” e perseguido. No dia seguinte algumas personalidades reuniram-se no paço episcopal e escolheram uma Junta de Governo presidida pelo bispo, já que o governador de Armas nomeado em meados de 1807, o general Bernardim Freire de Andrade, não estava em funções e na cidade. Assim, escolheu-se o bispo, que era o que determinava o Alvará sobre a substituição dos Governadores de inícios de 1777.
O governo interino das Armas foi entregue a um novo oficial, o coronel graduado de cavalaria Francisco Guedes de Carvalho Meneses da Costa, antigo governador de Moçambique. Nesse mesmo dia, novo destacamento do Regimento de Artilharia n.º 4 chegou ao Porto e a Junta Provisional do Supremo Governo decidiu reorganizar o Exército, de acordo com a sua antiga estrutura.
Em Bragança, no dia 11 de Junho, o general Sepúlveda tinha tomado conta do poder criado por pressão da população, escrito para Lisboa afirmando que os tumultos estavam controlados, sido eleito presidente da junta de governo, criada em 21 de Junho, e mandado recriar os antigos cinco regimentos de linha e os cinco de Milícias da Província. Quando os corpos começaram a ter uma organização mínima, mandou algumas forças para os locais onde seria possível atravessar o rio Douro.
Vila Real sublevou-se em 16 de Junho, sob a direcção do comandante do Regimento de Cavalaria n.º 6, o tenente-coronel Francisco da Silveira. Enquanto antigo comandante do Corpo de Caçadores Voluntários de Trás-os-Montes, criado em 1801 durante a guerra com a Espanha e a França, mandou reorganizá-lo e entregou a formação das oito companhias aos seus antigos comandantes. A companhia de Vila Real dirigiu-se para a serra do Marão, ao saber da chegada de uma coluna francesa vinda da Beira.
O comandante-chefe francês soube dos acontecimentos no Porto três dias depois, em 9 de Junho. No dia seguinte, de acordo com um plano acordado desde 28 de Maio5, prendeu e desarmou todas as tropas espanholas ainda em Portugal e colocou-as nos navios de guerra portugueses, fundeados no meio do Tejo, que não tinham podido deslocar-se para o Brasil em Novembro de 1807.
Em 12 de Junho Junot enviou ordens a Loison para se dirigir para o Porto a tomar o comando das províncias do Norte. Tendo recebido as ordens no dia 16, o recém-nomeado conde do Império saiu de Almeida no dia seguinte, 17 de Junho. A coluna militar chegou a Lamego no dia 20. No dia 21 atravessou o rio na barca da Régua e dirigiu-se para Amarante. As forças militares que o tenente-coronel Silveira organizou com a ajuda dos seus antigos subordinados, todos oficiais dos regimentos de Trás-os-Montes, esperaram a força de Loison na Serra do Marão. A vinda dos franceses era conhecida desde dia 19.6Como Harriot Slessor, viúva do general John Slessor,7 escreveu “no nosso lado do rio, que Loison tinha atravessado, não havia nada parecido com um exército para lhe resistir, mas havia um pequeno grupo de quarenta homens que se tinham reunido com um pequeno capitão, seu comandante, da altura do Pequeno Pulgar.”8 Atacaram primeiro a vanguarda, atraindo a coluna francesa para as alturas, e depois, demasiado cedo, a retaguarda. A tentativa de envolvimento da coluna de Loison não surtiu efeito, mas fez com que o general fosse obrigado a recuar, atravessasse novamente o rio Douro e se recolhesse a Almeida, onde chegou no dia 1 de Julho. Era uma vitória muito importante, essencial para o futuro das revoltas dos povos ibéricos, pelas reacções que provocou, mais do que pelos seus aspectos militares.
Nessa altura a revolta, em desenvolvimento permanente, tinha chegado a Coimbra, no dia 21 de Junho, tendo-se estabelecido uma junta de governo no dia seguinte, presidida pelo vice-reitor da Universidade, Manuel Pais de Aragão Trigoso. O governo militar foi entregue ao general Bernardim Freire de Andrade. O general não aceitou a incumbência e dirigiu-se para o Porto para assumir o Governo das Armas acompanhado pelo secretário da Regência, o brigadeiro D. Miguel Pereira Forjaz. O comando militar foi, então, entregue ao brigadeiro Nuno Freire de Andrade, chefe do Regimento de Infantaria n.º 11 (de Penamacor) e irmão mais novo do governador do Porto. Organizou-se uma expedição à Figueira da Foz, dirigida por dois militares, estudantes da Faculdade de Matemática, Bernardo António Zagalo, sargento de Artilharia 1, e António Inácio Caiola, sargento de Infantaria 13 (de Peniche). Em 27 de Junho, o forte, com uma guarnição de cem homens, rendeu-se. Guarnecido por uma força britânica da frota do almirante Cotton tornou-se um ponto fundamental para as comunicações entre as forças revoltosas e a frota britânica. A sublevação de Coimbra impediu as comunicações entre Loison e Lisboa criando um grande nervosismo no comando francês sobre os resultados da expedição ao Porto. Loison, não podendo regressar a Lisboa pela via mais curta, desceu pela Beira Baixa em direcção a Lisboa. Só em 11 de Julho se soube que estava a chegar a Abrantes9. Em 15 estava em Alcobaça, em 18 em Vila Franca de Xira, chegando as suas forças a Lisboa entre 20 e 22 de Julho.
As forças que perseguiram Loison pela Beira dentro, e algumas das que se organizaram em Trás-os-Montes dirigiram-se para Almeida e organizaram o bloqueio da fortaleza. As forças sitiantes foram formadas, numa primeira fase, pelos Regimentos de Infantaria n.º 12 (de Chaves) e n.º 24 (de Bragança), o 1.º Regimento de Milícias da Guarda, e as Milícias de Trancoso e Pinhel, assim como por companhias que se iam formando dos antigos regimentos da guarnição da Praça – os Regimentos de Infantaria n.º 11 (de Penamacor) e n.º 23 (de Almeida) –, com soldados que tinham abandonado as forças do exército português enviadas para França. A totalidade das forças sitiantes foi integrado no Corpo de Observação que se organizou em Viseu sob o comando do general Manuel Bacelar10, sendo o bloqueio continuado pelo 2.º Regimento de Milícias da Guarda11, mas a guarnição francesa de Almeida deixou de contar militarmente, não incomodando nem as forças portuguesas a concentrarem-se em Viseu, nem as espanholas a concentrarem-se em Cidade Rodrigo e Salamanca.
A expulsão das forças de ocupação francesas do Norte e Centro de Portugal em Junho de 1808 teve uma consequência importante para a continuação da guerra. Libertou o Exército da Galiza, comandando pelo general Joaquín Blake, de qualquer preocupação com o seu flanco direito. O Exército da Galiza que se tinha formado em redor de Lugo, estava a deslocar-se, desde 23 de Junho, para leste para defender a Galiza de qualquer ataque francês. Blake não desejava mais do que defender as portelas ao redor de Astorga, já no Reino de Leão, mas a Junta da Corunha impôs ao general o apoio ao Exército de Castela dirigido pelo general Cuesta. Sem forças hostis na sua direita Blake não pôde negar a ajuda e, em 5 de Julho, desceu das terras altas em direcção a Benavente, na planície leonesa. O pequeno exército de Cuesta, derrotado pelo general francês Lasalle em Cabezon, no dia 12 de Junho, perto de Burgos, tinha-se retirado para Benavente e, pouco depois, avançado em direcção a Valladolid, ponto importante na linha de comunicação do Exército Francês de Espanha. Os dois exércitos espanhóis encontraram-se em Villalpando, em 10 de Julho. Tendo avançado contra as forças francesas, foram derrotadas e desbaratadas pelo marechal Bessières em Medina de Rioseco, em 14 de Julho. A batalha permitiu que José Bonaparte chegasse a Madrid no dia 20 seguinte, mas teve uma consequência inesperada12. Napoleão, naturalmente preocupado com as linhas de comunicação do seu exército em Espanha, tinha reforçado Bessières, afirmando que reforçando-se o corpo do marechal, reforçava-se toda a Espanha13. As tropas que fortaleciam Bessières foram retiradas de Madrid, não tendo servido para apoiar as expedições a Valência ou à Andaluzia, nem tão-pouco o sítio de Saragoça. Mostrou também que as forças de Bessières não eram suficientes para impedir a revolta de Salamanca e de Cidade Rodrigo, e muito menos para poderem realizar qualquer acção em apoio do isolado exército de Junot. As consequências foram desastrosas.
O Exército Português no confronto entre grandes potências: Évora e Roliça
O mês de Julho de 1808 começou com as forças francesas expulsas do Minho, Trás-os-Montes, Beira e Algarve. As revoltas de várias localidades no Alentejo e na Estremadura não tiveram o mesmo sucesso, já que estavam demasiado perto do centro de operações do exército de ocupação para se puderem organizar convenientemente antes da chegada das colunas punitivas francesas. E a quase totalidade dos oficiais generais e superiores franceses tinha uma grande experiência na luta contra populações civis, assim como na utilização de medidas terroristas, previamente aprendidas na França ocidental, contra Chouans, Vendéens e outras populações monárquicas e católicas revoltadas contra os diferentes poderes políticos saídos da Revolução Francesa.
Se as revoltas de Vila Viçosa, em 19 de Junho, dirigida pelo major de Milícias António Lobo Infante de Lacerda, de Beja, no dia 25, não surtiram efeito, assim como as de Leiria, em 30 de Junho, e Tomar em 2 ou 3 de Julho, todas reprimidas selvaticamente, estes levantamentos não deixaram de contribuir para o recuo progressivo das tropas francesas e a sua concentração ao redor de Lisboa e Setúbal. O general Kellermann começou a abandonar o Alentejo em 1 de Julho, em direcção a Setúbal, mas a concentração definitiva deu-se só em 17 de Julho quando as forças do general Margaron, que tinham reprimido as sublevações de Leiria e Tomar se encontraram com as de Loison, vindas de Almeida, em Vila Franca de Xira.
As únicas forças britânicas presentes na península Ibérica até meados de Julho foram as do general Spencer que andava de um lado para o outro à procura de uma oportunidade de poder ser útil. Em 26 de Junho apareceram na embocadura do Tejo. O comando francês achou que eram mais de 10.000 homens, em vez dos menos de 5.000 que de facto eram. Pensou-se, pouco depois, que aquelas forças britânicas tivessem desembarcado, em princípios de Julho, perto de Alcobaça. Nada de muito consistente, mas o facto é que o aparecimento destas forças britânicas ao largo da costa portuguesa fez com que a expedição que o general Junot tinha pensado organizar contra a crescente concentração militar portuguesa em Coimbra não fosse realizada.
E o Exército Português da junta do Porto estava em formação acelerada.
Bernardim Freire de Andrade e D. Miguel Pereira Forjaz chegaram ao Porto no dia 28 de Junho, o primeiro, e no dia 1 de Julho o segundo26. A junta já tinha decretado, no dia 20, a reorganização das antigas forças militares do Governo das Armas, com a reorganização dos dois regimentos de infantaria do Porto (naquela altura com os n.os 6 e 18) e das Milícias, a junta provinciais também, mas os dois generais, que tinham participado nas propostas de reorganização do exército de 1802 e 1803, vão transformá-lo em 20 de Julho de 1808 de uma maneira quase imperceptível, criando quatro batalhões de caçadores27 e retirando da sua formação orgânica as companhias de caçadores.
Desde 6 de Julho, no dia seguinte à tomada de posse do governador das Armas do Porto, que tropas aquarteladas na cidade se começaram a dirigir para Coimbra. Primeiro um destacamento dos Regimentos de Infantaria n.os 6, 9 e 18 que conduziu armamento e munições, enquanto se foram concentrando no Porto tropas das outras províncias, como o Regimento de Infantaria n.º 21 chegado nos dias 9 e 10, e cujo primeiro batalhão saiu em direcção ao sul no dia 12 e o Regimento de Cavalaria n.º 6 (de Bragança), no dia 14, desmontado, para “se fornecerem d’armas e cavalos, e partirem depois para a sua destinação”28. No dia 17 foi a vez do 2.º batalhão de Infantaria 21 se dirigir para Coimbra e, no dia 1 de Agosto, foi a vez de dois batalhões dos regimentos do Porto, e de um único esquadrão do Regimento de Cavalaria n.º 6 – a dificuldade de remontar a cavalaria portuguesa irá ser grande – se dirigirem para sul. No dia seguinte foi um grupo de milicianos que se deslocaram em direcção ao Exército de operações. Nem todas as tropas que se incorporaram no exército português de operações passaram pelo Porto. O Regimento de Infantaria n.º 12 (de Chaves) concentrou-se em Viseu, depois de ter participado no bloqueio de Almeida, e dirigiu-se daí para Coimbra.
Durante esse tempo, em Évora, preparava-se a revolta da cidade.
É preciso notar que a cidade era um ponto de interesse estratégico. A revolta da cidade impediria as comunicações com Elvas e daí com Madrid. Não havendo já ligação com Almeida, a fortaleza de Elvas era essencial para uma eventual retirada das tropas francesas de ocupação em direcção a Espanha. Mas não só, era, sobretudo, considerada essencial para alimentar as tropas francesas e a população de Lisboa29, se fosse necessário ficar em Lisboa. O que interessa notar é que a revolta atrairia invariavelmente as tropas francesas de novo para o interior de Portugal. A revolta no Alto Alentejo tinha começado em Campo Maior, com ajuda de forças espanholas, criara uma junta de governo em 5 de Julho de 1808; a de Estremoz organizou-se no dia 15 seguinte, sob a presidência do tenente-general Francisco de Paula Leite, antigo governador de Elvas, e governador das Armas interino do Alentejo desde o abandono do marquês de Alorna do governo da província. O relato dos acontecimentos tem seguido de perto, como sempre, o relato de José Acúrsio das Neves, mas neste caso, há um documento importante para análise, publicado em 1814 – e por isso posterior à publicação da História Geral da Invasão – que coloca problemas importantes, sendo que, o que interessa para mim é saber se o general Francisco de Paula Leite foi personagem activo ou passivo na revolta do Alto Alentejo.
A obra, Mappa Historico-Militar-Politico e Moral da Cidade de Évora30, defende o general Leite da passividade que outras obras o acusam, posição divulgada por Acúrsio das Neves.31 Tento mostrar que a actuação do general Leite tem um objectivo estratégico; isto é, atrair os franceses para o interior do Alentejo, quando as forças expedicionárias britânicas estivessem preparadas para desembarcar na costa portuguesa. Por isso recusou a direcção da revolta de Vila Viçosa, assim como de Campo Maior, mas já não a de Estremoz e a de Évora.
O autor do Mappa, o prior de São Pedro de Évora, afirma que “entre o tenente-general Francisco de Paula Leite, e dois ou três indivíduos da cidade de Évora, se conservava secretamente o manejo das Regências de Sevilha e de Badajoz, sem que a Cidade o penetrasse, mas estes mesmos… viram-se finalmente exaustos de paliações para repelirem as amplíssimas promessas… que se lhes dirigiam. Cada dia maior corpo as coisas tomavam, e já não era possível deixar de comunicar-se o segredo, para se lançarem as sementes, que deviam produzir a… insurreição.32”
Se é possível descortinar o que o prelado quer dizer, através do seu estilo gongórico, defendo que o general Leite estava em contacto com as juntas espanholas e preparava secretamente o levantamento de Évora, sempre pressionado pelos espanhóis. Quando se deu o levantamento de Estremoz dirigiu-o e transferiu-se para Évora, o que aconteceu em 19 de Julho. Penso que se pode tirar uma conclusão: o levantamento deu-se de acordo com o interesse do general Leite e não com o dos espanhóis, que o tinham querido mais cedo, como é natural.
Estremoz era uma base militar importante. Local de um arsenal de artilharia – o Trem de Estremoz – quartel do Regimento de Artilharia n.º 3 (do Alentejo) e, desde 1801, do Regimento de Infantaria n.º 15 (2.º de Olivença), permitiria consolidar o levantamento da cidade e organizar as forças militares que se conseguissem criar.
E foi o que aconteceu. Com o levantamento de Estremoz e de Évora, no dia 20 de Julho, começaram a organizar-se as forças militares: os regimentos de infantaria e de cavalaria, as Milícias, alguns corpos de Voluntários.
Mas as forças organizadas em Évora e Estremoz não foram, de facto, em grande número. É possível que o recrutamento para o Exército que foi para França – a força que se tornou a Legião Portuguesa – tenha sido nesta região mais eficaz que no resto do país – o marquês de Alorna tinha sido seu governador – ou que a chegada dos soldados que abandonaram o corpo em Espanha não fosse tão rápida como nas regiões mais a norte de Portugal. Mas, mesmo assim, organizou-se o Regimento de Infantaria n.º 15, a que Acúrsio das Neves, chama o “batalhão de voluntários de Estremoz”, que foi organizado de novo pelo seu comandante de 1807, o coronel Aniceto Simões Borges, oficial que, enquanto tenente-coronel, tinha participado no combate de Arronches durante a Guerra de 1801, no comando do 1.º Batalhão do regimento. Para além deste corpo, conseguiu-se organizar duas companhias de tropas ligeiras e algumas tropas a cavalo do Regimento de Cavalaria n.º 5 (de Évora). Setecentos homens ao todo. As forças espanholas enviadas pela Junta de Badajoz eram um pouco mais numerosas: cerca de 1.700 homens.
A resposta francesa não se fez esperar. Loison foi chamado a Lisboa e enviado de imediato para o Alentejo, no comando de uma força de cerca de 6.000 homens. A divisão era formada por cinco batalhões de infantaria, o batalhão da Legião do Hanovre, e dois batalhões de granadeiros, formado pela junção das companhias de elite dos batalhões, e por quatro esquadrões de Dragões e oito peças de artilharia33. Quase metade das forças operacionais francesas, considerando que mais de um terço dos corpos de infantaria franceses estavam adstritos a funções de guarnição, em Elvas, Almeida, Peniche e Lisboa, ficavam dois terços para operações de campanha. Esta expedição ao Alentejo implicava o envio de mais de um quarto da infantaria (6 batalhões em 24, mais os granadeiros) e um quarto da cavalaria (2 esquadrões em 9). Foi um erro extraordinário que deixou livre de tropas francesas o Norte da Estremadura e a Beira, onde se concentrava o Exército Português e se preparava para desembarcar a força expedicionária dirigida pelo general Wellesley. Para os interesses aliados – Portugueses, Britânicos e Espanhóis – uma vitória estratégica que nada fazia prever tão completa.
A verdade é que, se a estratégia foi coroada de êxito, a população de Évora sofreu muito às mãos das tropas francesas. O combate de Évora, de dia 29 de Julho de 1808, em frente da cidade, no alto dos Moinhos de São Bento, e o saque da cidade durante três dias, até 31 de Julho, no dia em que o exército britânico chegou à foz do rio Mondego, fez algumas centenas de mortos.
Totalmente livre de forças francesas à sua frente, com o seu flanco esquerdo protegido pelo Exército de Operações de Bernardim Freire de Andrade, concentrado em Coimbra, a força expedicionária britânica demorou oito dias a desembarcar a infantaria, a organizar os seus abastecimentos, a tentar montar a sua artilharia e a preparar a sua cavalaria. Teve tempo para tudo. Como escreveu o general Thiébault “não havia nada a opor [ao Exército Britânico] com esperança de sucesso”. O general Delaborde tomou o comando de uma pequena força – uma brigada – composta de cinco batalhões de infantaria e do esquadrão de caçadores a cavalo e saiu de Lisboa a 6 de Julho.
Junot ficou em Lisboa e na península de Setúbal com três batalhões das duas primeiras Divisões, tropas veteranas em geral, e os seis batalhões “franceses” da 3.ª Divisão, composto fundamentalmente por recrutas italianos que tinham sido bastante castigados durante a revolta do Algarve e no Alentejo no regresso a Lisboa.
O Exército da Junta do Supremo Governo do Porto era formado por dois batalhões dos dois regimentos do Porto, pelo Regimento de Infantaria n.º 12 (de Chaves), o mais completo de todos, com os seus 1.200 efectivos, e o n.º 21 (de Viana), seis batalhões de infantaria, acompanhados pelos três batalhões de granadeiros formados com as doze companhias dos seis regimentos de infantaria das províncias do Norte. Acompanhavam esta pequena força, dois batalhões de caçadores acabados de criar, o de Trás-os-Montes e o do Porto, dois regimentos de Milícias, os do Porto e Moncorvo, no fundo dois batalhões, e uma força de cavalaria com cerca de 900 cavalos. Não era muito, mas era uma força determinante para o futuro, que mostrava que se podia contar claramente com a população e com as elites portuguesas para combater a França napoleónica.
Como é sabido a estratégia seguida pelas duas forças aliadas não foi coincidente. Mas se as forças portuguesas não se incorporaram na força expedicionária britânica, não deixaram de prestar um relevante serviço à causa nacional e aliada, ao impedir o destacamento de Loison, vindo de Évora em marchas forçadas, por Abrantes e Santarém, de se unir às forças de Delaborde em Óbidos e de participar no combate da Roliça, atacando o flanco esquerdo britânico. De facto, desde o princípio da campanha essa era uma preocupação do comandante britânico: impedir a junção dos dois corpos inimigos na zona do vale que separa a serra dos Candeeiros da serra de Montejunto. Por isso “receoso de que Loison chegasse à Roliça, na noite de 17 para 18, [o general Wellesley] resolveu-se a atacar sem demora.34” E porque é que Loison não chegou a tempo à Roliça? Segundo o mesmo autor, porque “se demorara três dias em Santarém sem motivo plausível, e na marcha desde a cidade foi duma morosidade inadmissível.” [os sublinhados são meus] O autor, interessantemente, como quase todos os que lhe seguiram, não nota que esta actuação só pode ter sido provocada pelas forças portuguesas, que se movimentavam na retaguarda de Loison, tanto a leste, com o Corpo de Observação da Beira, comandado pelo general Manuel Pinto Bacelar, a ocupar Abrantes e a persegui-lo pela Lezíria; como a Norte, o Exército de Operações de Freire de Andrade que por meio dos reconhecimentos feitos pela cavalaria, ia obrigando Loison a cuidar da sua retaguarda e do seu flanco direito.
Loison não chegou a Óbidos e não se reuniu ao general Delaborde. Indo à frente da sua força, encontrou-se com o duque de Abrantes junto ao Cercal, e perto da povoação num outeiro para onde subiram ouviram os sons do combate. Mas não participaram nele.
Foi a sua última oportunidade de vencer as forças britânicas.
Depois deste falhanço, com os reforços que o general Wellesley recebeu pela praia da Maceira, não havia dúvidas do que aconteceria. Os 13.000 soldados que Junot agrupou em Torres Vedras não seriam capazes de vencer os 16.000 britânicos reunidos em torno do Vimeiro.
Como era natural, as investidas desorganizadas das forças francesas durante a batalha do dia 20 de Agosto de 1808 foram todas rechaçadas.
O Exército Português, mais uma vez, não participou no confronto. Mas cumpriu o seu dever, mesmo que quase nunca notado. Foi o aliado necessário a uma força de desembarque, que protegeu permanentemente o flanco descoberto do aliado, e cumpriu essa função sem falhas.
Marialva (D. António Luís de Meneses, 3.º conde de Cantanhede, e 1.º marquês de).
f. 16 de Agosto de 1675.
General do exército do Alentejo, conselheiro de Estado e de guerra, um dos generais que mais se distinguiram na guerra da Restauração de 1640.
Acerca da data do seu nascimento divergem alguns biógrafos; parece, porém, que deve merecer maior crédito o escritor coevo conde da Ericeira, D. Luís de Meneses, que na sua obra o Portugal Restaurado, dá em 1657 D. António Luís de Meneses com mais de 60 anos, vindo, portanto, a nascer ainda no século XVI. Faleceu em 16 de Agosto de 1675, como diz P. Francisco de Santa Maria, no vol. II do Anno Historico, e D. António Caetano de Sousa, nas Memorias historicas e genealogicas dos grandes de Portugal, posto que por engano tivesse dito 19 de Maio no tomo V da Historia Genealogica.
Era filho do 2.º conde de Cantanhede, de quem herdou o título, D. Pedro de Meneses, e de sua mulher, D. Constança de Gusmão, filha do 1.º conde de Vila Franca, Rui Gonçalves da Câmara. Continuas lutas se seguiram à revolução do 1.º de Dezembro de 1640, provocadas pelos exércitos castelhanos, que procuravam energicamente passar as fronteiras de Portugal; o conde de Cantanhede tomou parte muito activa nestas lutas, distinguindo-se sempre pelo seu grande arrojo e valentia. Fora nomeado coronel no próprio dia 1.º de Dezembro, quando se realizou a aclamação de D. João IV. Organizou-se depois em Coimbra um regimento de 1.660 homens, de que ele era o comandante, regimento que se tornou muito afamado pelas provas de valor e de intrepidez com que sempre se distinguia nos combates em que entrava. Quando em 1641 o coronel conde de Cantanhede chegou a Cascais, el-rei quis recompensar-lhe os serviços prestados em honra da pátria, dando-lhe um lugar da maior importância e confiança na corte, que o distinto fidalgo não aceitou, porque a carreira das armas, para que tinha decidida vocação, lhe fazia antever um futuro brilhante de vitórias e de feitos heróicos. Quando era preciso reforçar as tropas que guarneciam as fronteiras, recorria-se sempre ao valioso auxílio de D. António Luís de Meneses.
Em 1656 morreu D. João IV, e até esse momento o ilustre fidalgo, que usava do título de conde de Cantanhede, não aceitou cargo algum de importância na corte, por ser do partido contrário ao conde de Odemira, que tinha todo o valimento real. Os afeiçoados do conde de Cantanhede só começaram, portanto, a salientar-se na corte, depois do falecimento do monarca. Corria o ano de 1658. A praça de Elvas, de que era governador D. Sancho Manuel, depois conde de Vila Flor, achava-se cercada por um exército de 3.000 homens comandados pelo general castelhano D. Luís Mendes de Haro. A rainha D. Luísa de Gusmão, regente do reino pela menoridade de D. Afonso VI, escreveu em 2 de Dezembro de 1658 a seguinte carta: «Conde amigo. Eu el-rei vos envio muito saudar, como aquele que amo. É de tanta importância acudir à província do Alentejo com uma pessoa que a governe, enquanto o inimigo persiste sobre Elvas, e que esta seja tal, que a alente e console, e tenha autoridade, actividade e zelo para formar um exército capaz de ir socorrer aquela praça, se o pedir a necessidade, que ainda que a importância da vossa pessoa nesta corte pedia-vos não apartasse de mim, me é preciso encomendar-vos partais logo a livrar-me do cuidado em que me tem posto as coisas daquela província, e a fazer-me, e a este reino um serviço tão grande, como aquele será; e porque para tão conhecido amor como me tendes, e ao reino, e por o muito que desejais sua conservação, e defesa, são necessárias poucas palavras para vos persuadir vades acudir a tão grande ocasião com estas poucas regras espero partireis logo, e por elas mando a todos os cabos, e oficiais de guerra, justiça e fazenda vos obedeçam e cumpram as vossas ordens, em tudo o que tocar ao intento referido, em que espero façais o que deveis a quem sois, e à boa vontade que vos tenho, que são dois motivos bem grandes, para um homem como vós». Não contente com esta carta, a rainha mandou chamar o conde, e disse-lhe: «Sois tão empenhado na conservação deste reino, tendes tanta actividade e tão grande coração, que fio de vós o socorro da praça de Elvas, que é a muralha, que na província do Alentejo nos defende de nossos inimigos; parti-vos logo para Estremoz, e fiai da minha diligência mandar-vos assistir com toda a gente e cabedais que houver no reino, e não tenhais pelo menor socorro as desatenções e desconcertos, que os castelhanos costumam ter nos seus exércitos, quando as empresas são dilatadas; e dou-vos licença para que na certeza desta inteligência me tenhais por castelhana.»
O conde de Cantanhede, a quem somente agradavam empresas dificultosas, beijou a mão da rainha, muito reconhecido pela distinção que recebera. Pondo-se em seguida em movimento, reuniu todas as tropas de que podia dispor, mandou comunicar astuciosamente a D. Sancho Manuel, que estabelecera o seu quartel-general em Estremoz, e que contasse com o mais pronto socorro. O exército, assim organizado, saiu de Estremoz em 11 de Janeiro de 1659, e chegou dois dias depois à frente das linhas de Elvas. Seguiu-se a grande e memorável batalha no dia 14, que foi uma das maiores glorias para D. António Luís de Meneses (V. Portugal, vol. III, pág. 125 e seguintes). D. Afonso VI e a rainha regente, sua mãe, estavam na igreja de Santa Engrácia assistindo à festa que a nobreza costumava fazer em desagravo do desacato ali cometido, quando recebeu a notícia da vitória alcançada. Foi tal o entusiasmo que imediatamente se cantou um solene Te Deum em acção de graças; em seguida D. Afonso e a rainha foram para o paço da Ribeira, com a corte, no meio das mais entusiásticas aclamações do povo. Quando o conde de Cantanhede regressou a Lisboa, foi recebido no paço com as maiores honras e distinções, vindo o próprio rei, por conselho do conde de Odemira, espera-lo à entrada. O conde de Cantanhede recebeu muitas mercês, sendo também agraciado com o título de marquês de Marialva, por decreto de 11 de Junho de 1661, juntando-se depois a esta honra o juro e herdade por alvará de 14 de Maio do 1675. Sendo governador das armas na província da Estremadura, desejou o marquês de Marialva ir comandar no Alentejo, mas a rainha, receando que o conde de Atouguia, que então governava aquela província, se despeitasse, assim como as pessoas que compunham o novo partido que principiava a formar-se em torno de D. Afonso VI, pediu ao marquês que desistisse daquela pretensão. O marquês cedeu ao pedido, porque percebeu bem a inconveniência e até o perigo que poderia haver em sustentar discórdias internas, quando os inimigos da pátria estavam continuamente obrigando os portugueses a entrar em combate. Nesta inteligência marchou para o Alentejo, comandando somente as forças auxiliares da Estremadura. Foi neste tempo, em 1661, que D. João de Áustria entrou em Portugal com o seu exército, mas assim como acontecera anteriormente, não houve luta alguma militar digna de menção, porque os castelhanos ainda estavam muito ressentidos da derrota de Elvas, e não se animavam a organizar forças suficientes para intentar nova invasão de Portugal. Contudo, o intrépido guerreiro praticou heróicas proezas nas campanhas de Estremoz, de Juromenha, e de Arronches.
Em 1662 o marquês de Marialva desejou ardentemente passar pela segunda vez ao governo das armas do Alentejo, e como para conseguir esse intento era preciso primeiro demitir o conde de Atouguia, lembrou à rainha que o conde era digno de ser nomeado general da armada real, muito principalmente havendo desconfianças, que na próxima primavera os espanhóis recomeçariam os seus ataques. A rainha, que muito respeitava o marquês, e desejando ser-lhe agradável, mandou oferecer ao conde de Atouguia a nomeação desse novo cargo. O conde recebeu a oferta com profundo pesar, e não podendo vencer a cólera que o dominava, respondeu à soberana com as mais sentidas frases, o quanto lhe era penoso tirarem-lhe aquele governo, principalmente na ocasião em que as prevenções de Castela ameaçavam maior perigo. Esta resposta obrigou a rainha a hesitar alguns dias em fazer a nomeação do marquês de Marialva para governador das armas do exército na província do Alentejo; este, porém, tanto insistiu que afinal venceu todas as dificuldades. Sabendo isto, o conde de Atouguia pediu licença à rainha para se retirar à corte, e depois, a conselho do duque de Cadaval, a quem a regente pedira particularmente para resolver o conde a aceitar a nomeação, que ela lhe oferecera, resignou-se a satisfazer a vontade soberana. O marquês de Marialva desta vez não foi tão feliz nos seus empreendimentos, e muito mais porque servindo no exército o conde de Schomberg, o nosso general possuiu-se profundamente da ideia de que vinha aquele estrangeiro murchar-lhe os louros da sua brilhante vitória das linhas de Elvas. Tomando D. Afonso VI posse do reino e começando o conde de Castelo Melhor a exercer o seu omnipotente ministério, o marquês de Marialva perdeu muito no régio valimento; deixou o governo das armas no Alentejo, sendo substituído por D. Sancho Manuel, que fora agraciado com o título de conde de Vila Flor. Mas chegando a Lisboa a notícia da tomada de Évora por D. João de Áustria, houve necessidade de mandar com toda a pressa reforços para o Alentejo, e foi ainda o marquês de Marialva que marchou à frente dum exército, na maior parte com posto de muitos voluntários da primeira nobreza. Chegando aquela província reuniu-se ao conde de Vila Flor, e tomou parte importante na recuperação da cidade de Évora. Em 1661 tomou Valência de Alcântara, uma das principais praças da Extremadura espanhola, onde também se distinguiu. Em 1665, estando em Estremoz, correu em 17 de Junho a Vila Viçosa, que os espanhóis haviam sitiado; foi, porém, surpreendido pelo general Carracena em Montes Claros, e ali se travou combate, que foi mais uma vitória para o marquês de Marialva, e a ultima coroa dos seus triunfos bélicos (V. Montes Claros). A derrota de Carracena enfraqueceu muito o ânimo dos castelhanos, que se confessaram vencidos, e deu causa à Espanha solicitar a paz, sendo o ilustre guerreiro um dos plenipotenciários, que assinaram o tratado em 13 de Fevereiro de 1668.
O marquês de Marialva exerceu os seguintes cargos: conselheiro de Estado e da guerra, vedor da fazenda real, ministro do despacho, governador das armas de Lisboa, Setúbal, Cascais e Estremadura, e capitão-generaI da província do Alentejo. Em 1669 foi nomeado procurador das cortes de Lisboa por uniforme sufrágio do povo e da nobreza, devendo-se a ele grande parte dos negócios que se concluíram. A sua opinião era sempre muito considerada e ouvida em todas as questões sérias, que em Portugal se deram naquele tempo. Chamavam-lhe o libertador da pátria. O marquês de Marialva era senhor das vilas de Merles, Mondim, Cerva, Atem, Ermelho, Bilho, Vilar de Perreiras, Avelãs do Caminho, Leomil, Penela, Póvoa e Valongo; senhor do morgado de Medelo, e S. Silvestre, comendador de Santa Maria de Almonda, e da ordem de Cristo, etc. Havia casado em 1635 com D. Catarina Coutinho, filha e herdeira de D. Manuel Coutinho, senhor da Torre do Bispo. Teve 2 filhos e 7 filhas: D. Pedro António de Meneses, que foi o 4.º conde de Cantanhede e 2.º marquês de Marialva; D. Manuel Coutinho, que D. Pedro II agraciou com o título de conde do Redondo; D. Guiomar de Meneses, que casou com seu tio paterno D. Rodrigo de Meneses; D. Maria Joana Coutinho, que foi marquesa de Cascais pelo seu casamento com o 2.º marquês deste título D. Luís Álvares de Castro; D. Isabel de Meneses, casada com D. Lourenço de Lencastre, comendador e alcaide-mor de Coruche; D. Antónia de Meneses, D. Jerónima Coutinho e D. Maria Coutinho, que foram religiosas no convento da Esperança, de Lisboa, e D. Joana de Meneses, que faleceu sem estado. O marquês de Marialva determinou que o sepultassem na vila de Cantanhede, e o seu coração ficasse no convento de S. Pedro de Alcântara, de Lisboa, dos religiosos da província da Arrábida, que ele próprio mandara edificar em 1670 em acção de graças da vitória de Montes Claros. Do livro mais antigo dos óbitos daquele convento consta que efectivamente o coração ali se conservara, com todo o respeito, dentro dum cofre de prata, até que por ordem de D. Pedro II, sendo ainda regente, foi trasladado para o convento de S. Vicente de Fora, ficando colocado no pavimento junto ao túmulo de D. João IV, com a seguinte inscrição:
HIC, UBI LUSIADUM JACET INSTAURATOR IN UNA,
PIGNUS HABET POSITUM COR MARIALVA SUUM,
CORDE SUUM SEQUITUR REGEM MARIALVA SEPULTUM,
UT VITAM CREDAS, NON PERIISSE FIDEM.
O cadáver do ilustre militar foi depositado no convento de Cantanhede, sendo as vísceras junto ao coração sepultadas na capela-mor da igreja junto do túmulo da marquesa, sua mulher. As armas dos Marialvas são: Escudo esquartelado; nos primeiros a quartos quartéis as armas reais com o filete; nos segundo e terceiro em campo azul as três flores de lis de ouro, e sobreposto o escudo dos Meneses, que é em campo de ouro um anel.
Primitivos Portugueses (1450-1550). O Século de Nuno Gonçalves
11 Novembro 2010 - 23 Abril 2011
Piso 3
Primitivos Portugueses (1450-1550)
O Século de Nuno Gonçalves
Museu Nacional de Arte Antiga - 11 de Novembro 2010 a 23 de Abril 2011
Museu de Évora - 18 de Novembro 2010 a 23 de Abril 2011
Comissário: José Alberto Seabra Carvalho
Resumo
Reunindo e colocando em confronto mais de 160 pinturas dos séculos XV e XVI, reconstituindo alguns dos mais belos retábulos portugueses desse período, esta exposição ensaia um panorama crítico, actualizado e de grande dimensão, acerca dos chamados Primitivos Portugueses e visa demonstrar como o estudo técnico e material desse património contribui decisivamente para renovar e aprofundar o seu conhecimento. Assinalando o centenário da primeira apresentação ao público, em 1910, dos Painéis de S. Vicente, que desde então passaram a constituir, nacional e internacionalmente, a obra “fundadora” e mais célebre da arte da pintura em Portugal, a exposição procura também documentar e questionar as noções de “originalidade artística” e de “identidade nacional” tradicionalmente associadas ao brilhante ciclo criativo dos Primitivos Portugueses, iniciado por Nuno Gonçalves e depois prosseguido e consolidado pelos nossos pintores da primeira metade do século XVI.
Contando com a colaboração de muitas colecções públicas e privadas, a selecção de peças privilegiou quer os painéis retabulares mais importantes, quer as pinturas menos conhecidas, algumas oportunamente restauradas para esta ocasião. Do estrangeiro, comparecem importantes obras de museus de Itália, França, Bélgica e Polónia.
A estrutura da exposição tem uma dominante de ordenação cronológica mas combina essa sequência de base com um agrupamento das obras em função dos confrontos comparativos (estilísticos, iconográficos, etc.) que importa suscitar.
O percurso integra uma vasta quantidade de materiais gráficos, incluindo uma zona exclusivamente dedicada ao conhecimento, exposição e polémicas relacionadas com os Primitivos Portugueses desde 1910. Inclui também uma vasta documentação laboratorial associada à investigação do processo criativo das pinturas mais relevantes.
O núcleo expositivo no Museu de Évora é especialmente dedicado aos pintores luso-flamengos e às oficinas activas na cidade nas primeiras décadas do século XVI.
A produção desta exposição conta com o apoio da Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República
La música en las antiguas culturas mexicana
Jesús Ademir Morales Rojas
- Huehuecoyótl - Imagen tomada de códice prehispánico
La música poseía una gran relevancia en los rituales aztecas, tanto que existían sitios destinados ex profeso para la instrucción musical de la juventud, a los cuales se les denominaba como cuicacalli “casa del canto”. Por otro lado, en construcciones conocidas como mixcoacalli, se guardaban los instrumentos y atavíos para las danzas y los cantos. Allí también se congregaban quienes tocaban el teponaxtle (tambor elaborado con un tozo de tronco).
En otro edificio, el mecatlan, se enseñaba como tocar diversos instrumentos musicales, en especial los de viento. En este sentido, existían sacerdotes expertos en componer y revisar los cantares de los rituales: los epcoacuacuilli tepictoton, componían cantos para ser interpretados en los tempos y en las casas particulares, mientras que los tlapizcatzin, perfeccionaba los cantos dedicados a las diferentes deidades.
http://www.youtube.com/watch?v=qQcME3yQkMI&feature=related